agosto 25, 2020

Prata da casa


Sirvo-me de meia em meia fatia de luar

Sacio-me de mais um gole de escuridão 

E alcanço em mim esta letargia de nada 

Entre cada garfada de querer


Enfrento de pé bancos de pedra 

Que me sentam o pensamento 

Entre uma e uma

E outra e outra 

Fatia de desejo


Ato e desato os problemas

O sapato!

Levanto e espero!

Espero e sossego

O silêncio faz-me farto


Limpos os cantos da boca

A uma ponta de brisa

Entre cada meia fatia

De luar e escuridão 


Congelo os talheres

Suspendo a visão

E no fim de tudo

Nem uma água com gás

Para apaziguar este mal estar...


texto | foto   rui marques



abril 01, 2018

Dia 1

Hoje de manhã, quando tu chegares
já cá não estarei...
já tranquei a porta
para não mais entrar.
Apaguei as luzes
fechei as janelas
e a mim também
como se não fosse
nem cá mais voltasse
para me abrigar.

Desci pelas escadas
com as pernas tontas
e as palavras soltas
de tanto pensar.
Deixei a lembrança
o vestido preto
trouxe o meu olhar
de peito no chão
a relampejar.

Fechei o correio
com a carta vazia
sem tentar dizer
que quando chegares
mesmo que esperares
já cá não vou estar


texto | etherium



fevereiro 26, 2015

Desabitada


Quando finalmente leres estas palavras não sei se ainda te recordarás de nós
Não sei se recordarás apenas os maus momentos
ou sequer se conseguirás nomear todos os sorrisos do início desta viagem
Mas sei que neste momento não só eu parti como tu achaste por bem que o fizesse
Após tempo e mais tempo de verdades escondidas e sentires nunca ditos
De desejos secretos nunca assumidos perante aquilo que somos
Fomos
Nós…
Não sei bem quando tudo começou a escorrer de nós
Quando esse veludo na pele se transformou em papel de areia
Insensível, frio, sem força…
Não sei quando o anseio por nos vermos deu lugar a um sentir de
Peso e fardo
Quando os suspiros de saudade desembocaram num lugar de tédio sem fim…
Apenas sei que aqui nos desencontramos
Eu aqui
Tu aí
E mesmo que aqui fiques
Sei que o farás apenas por momentos e escalas
Entre sonhos e desejos escondidos
E olhares que anseias sentir de novo…
E por isso, não digo adeus
Digo apenas que gosto de te olhar de quando em vez…
Sabendo que no meu ser
Não o esquecerei até ao dia
Em que leres estas palavras

E recordares todo o sonho que nós fomos.

texto | etherium
foto | last letter - 2 by braq > www.deviantart.com

setembro 10, 2013

Alegoria de um dia qualquer


Talvez te encontre bem quando olhares estas palavras
Mas, no fundo, não sei se abrirás sequer o envelope 
Ou se irás saltar até ao próximo capítulo...
Hoje, neste dia cinzento percorro os caminhos da memória 
Em busca do momento em que o brilho desapareceu dos teus olhos
Em que passei a ser um fardo
Ou simplesmente uma montanha de bocejos e silêncios 
Percorro o tempo no momento em que te empurrei para longe
E deixei de ser o sorrir do dia-a-dia
Antes o outono o ano inteiro...

Aqui à distância vejo-me curto
Besta de pensar
Máquina de triturar momentos que marcam 
Sei que já saíste
Mas sabes o código da porta... 


texto.imagem | rui marques

julho 25, 2013

Hoje

Hoje porque é assim
Dói
Hoje porque tem de ser
Custa
Hoje porque se paga o que passou
Magoa
Hoje porque é assim
Tem-se medo do que vem
E o futuro sonho que seja
Nosso

março 16, 2013

A dor das horas



Aqui à distância encontro-me perto!
Perto daquele estado de fim
Daquele sentimento de revolta
Do mais estranho precipício
Tosse...

Aqui a meio caminho, perco-me em mim
Na minha sede, na minha fome!
Aqui a meio apetece-me saltar
Apetece-me subir
Para assim cair mais alto
Tosse, tosse...

Aqui ao lado, desfaço-me em mil
E sei que não me vês
Não me olhas
Não me procuras...
Aqui em baixo, colo-me em cacos
E parto-me outra vez
Conto: "Um, dois, três"...
E fico por cá, à espera de ser visto
De ser olhado, de ser um dia especial
Tosse, tosse, tosse!
Saiu...


texto | foto rui marques

janeiro 29, 2012

Ponto

O meu maior medo é a dor…
A minha maior dor é o medo…
O meu pior momento é o que sobe e fica estático,
Que cobre e descobre que volta e revolta…
O meu maior medo vem da dor
Da dor de ter medo, de cegar e parar
De correr e andar, de sentir e gritar
De sofrer e parar!

O meu pior momento é o fim
Que nem principio de tudo e nada!
É cegueira de branco e vazio, escuro gelado e perene!
É rasgar os pedaços de tempo e esquecê-los no tampo da mesa…

O meu maior medo é o medo em si…
Em mim, de mim e por mim!
A minha maior dor é da dor de olhar em frente e ver o fim…

texto|foto  rui marques