Cadenciada pelo som do ranger da madeira
sentada no alpendre da sua fachada de vida,
balançava pausadamente
aguardando pela imagem que mais ansiava...
Numa das suas mãos, hoje em dia enrugadas e secas
pousava ternamente um colar de contas,
que mais não significava a sua fé em receber a visita
que mais almejava...
Na outra, o livro que nunca escrevera
mas sempre tinha sonhado ler
tivera ele sido escrito...
Tinha passado por ela uma vida de tormento
salpicada pelo ressentimento
de um sentimento antigo...
E, por mais que tentasse esquecer aquele momento
- apesar de nunca o ter desejado -, todos os dias daí em diante
foram vividos na dor daquele átrio frio, escuro e nu...
Os olhos serenos e límpidos repousam no horizonte,
enquanto vislumbra o vapor da máquina a aproximar-se...
À medida que a lágrima fugidia escorre pela sua pálpebra
pousa, melancólica mas ardentemente, o colar no seu regaço
ao mesmo tempo que a sua mão se ergue, vagarosamente,
carregando todo um passado de desejo e sonho,
em direcção da velha mesa de madeira que a acompanha...
O compasso da chegada da visita desejada apressa-lhe o movimento
ao pegar,
com a força que ainda lhe resta,
no velho bilhete gasto pelas memórias...
A viagem é sua...
O livro caiu...
E não mais ela voltará à sua solidão...
texto | rui marques
foto | one last goodbye by ~googleist>www.deviantart.com